ANJOS E DEMÔNIOS

05/08/2012 23:03

 

Quando o viver torna-se algo automático, sem emoções, cheio de referências do senso comum?

Faz-se algo porque sempre foi feito daquela maneira. Vive-se com aquela pessoa por falta de vontade de procurar por aquele “amor verdadeiro”, já que se chegou à conclusão que isso só existe nas novelas...

Quando o viver torna-se tão insuportavelmente real que o sonho foge dele como o diabo da cruz?

Conversando com um amigo, que mostrava seus escritos da adolescência. Algumas coisas até premonitórias. Como se sua alma tivesse antevisto seus caminhos futuros e lastimasse já aquela altura a tristeza do porvir.

Será que a alma já conhece, nas dobras do que lhe é oculto até a si mesma, qual será o seu futuro? Ou o futuro desenha-se de acordo com a pré-disposição fitada pela sua personalidade?

Fato é que , com todo o culto ao novo, ao jovem, vivemos, no ocidente, com uma expectativa nebulosa para nossos anos maduros, e assim, quando eles chegam encontram a aridez da falta de expectativa e esperança.

Alguns olham para trás, saudosos de outros tempos. Outros fazem pior: ressenten-se do que não tiveram coragem de fazer. Alguns desses, como que disputando uma questão de vida e morte contra o relógio, começam a se atirar às coisas que queriam ter, ou fazem o que sonharam em fazer, e, sorridentes comprovam ativamente que a vida começa aos 40.

Realmente, começa aos 40, junto com um sem número de percalços, pequenas falências físicas ou morais, inúmeras pequenas certezas(mutiladoras vorazes dos sonhos cada dia mais distantes). Começa um novo tempo onde todas as preocupações apreendidas, contornadas e dribladas ao longo dos últimos 20 anos simplesmente deixam de existir. Os filhos cresceram, a carreira já tomou um formato meio sem retorno, a vida material perseguida já demonstrou tudo o que se conseguiu. Não há tanto mais a fazer, mas sim começar a olhar para a montanha espiritual. Respirar fundo e decidir se deseja escalar até o topo a montanha de sua relação consigo mesmo e com o Divino dentro de si.

Depois de tanto tempo em busca da prática, do material, correr atrás do menos palpável, dá no mínimo a sensação de se tornar outra pessoa. É a morte daquela fase que de tão material, representa a morte física, e o retorno da alma à sua vocação espiritual.

Mas se assim é, porque a realidade, o saber adquirido, toma a proporção danosa que revela a dificuldade de ainda crer em anjos e demônios?

Quem sabe para evitar olhar a própria sombra e perceber que estamos a caminho da angelitude, e que a alma que previa o próprio futuro na adolescência, na verdade era o próprio demônio dentro de si. No real sentido da palavra demônio: a dúvida.